UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
SEQUÊNCIA DIDÁTICA DE ENSINO DE HISTÓRIA
“NOÇÕES DE ESPACIALIDADE E REPRESENTAÇÕES URBANAS NA BAIXA IDADE MÉDIA”
DISCIPLINA: História Medieval II
PROFESSORA RESPONSÁVEL: Ana Paula Tavares Magalhães Tacconi
PERÍODO: Noturno – 2º Semestre de 2021
ALUNO: Lucas Albertini Leal
RECORTE CRONOLÓGICO:
- Baixa Idade Média e Alta Idade Moderna (1200-1500).
EIXO TEMÁTICO:
- As cidades europeias da Baixa Idade Média e as suas representações.
- O advento do capitalismo (bancos, feiras, rotas comerciais etc.).
SERIAÇÃO:
- É sugerido que esta sequência didática seja ministrada a estudantes do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio já familiarizados com conteúdos relativos à transição da Idade Média para a Idade Moderna.
OBJETIVOS:
- Apresentar como artistas tardo-medievais entendiam o espaço urbano e como o representavam através de uma reflexão sobre Cartografia, História, Educação Artística e Geografia Urbana, e trazer para a sala de aula a discussão sobre como trabalhar conteúdos de História a partir de imagens.
CONTEÚDO:
- Esta sequência didática consiste em seis atividades a serem realizadas individualmente em aula, e uma Atividade de Avaliação em grupo ao final. A estruturação flexível desta sequência permite que sejam feitas alterações e que outras atividades sejam adicionadas, segundo o julgamento de quem a ministrará. Optou-se pelo uso de fontes imagéticas relacionadas ao recorte temporal estipulado e de fotografias atuais, pois isto pode auxiliar estudantes a desenvolverem uma visão crítica sobre as representações e a aproveitarem da melhor maneira as informações que lhes são fornecidas em cada atividade.
DURAÇÃO DAS ATIVIDADES:
- O ideal é estas sejam realizadas no período de duas aulas de 90 minutos cada, mas as mesmas podem ser adaptadas a depender do tempo disponível. O prazo para a entrega da Atividade de Avaliação deve ser estipulado pelo ministrante.
DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES:
- Atividade 1 (Introdutiva):
® Materiais: revistas, jornais, cartolinas, tesoura, cola, lápis-de-cor e canetas coloridas.
® Proposta: esta atividade tem o objetivo de fornecer instrumentos metodológicos para a análise de imagens, que serão trabalhadas nas atividades seguintes. Os estudantes devem representar a cidade onde vivem através de desenhos e colagens. É importante que o ministrante instigue questionamentos como: “o que você considera importante representar?” etc. A ideia desta atividade é trabalhar a bidimensionalidade, já que a tridimensionalidade será trabalhada na Atividade de Avaliação. Ao final, é importante ressaltar que, ao criarem uma representação, os estudantes criaram uma distorção da sua cidade.
® O ministrante pode apresentar o significado de “representação” proposto por Silvia Magnavacca em Léxico Técnico de Filosofia Medieval, que corresponde à “reprodução de uma coisa que guarda similitude com ela”. Isto associa-se ao conceito escolástico de conhecimento, calcado na similitude com algo que se conhece (assim como o homem é imago et similitudo Dei).
® É importante mencionar o diálogo entre decus (adequação ou intenção do autor) e “interpretação”, e que isto está presente não só na representação que criaram como nas imagens que serão analisadas a seguir.
- Atividade 2:
® Materiais: figuras 1 e 2, destacadas abaixo, e caderno.
® Proposta: a ideia é que os estudantes destaquem elementos que julguem relevantes para a análise das imagens, como o número de igrejas representadas, cores utilizadas, sensações que sentiram ao observar etc.
® É importante que seja discutida a preferência dada à representação das rotas externas à cidade em detrimento das internas, com a exceção de pequenos trechos nas imediações das igrejas. Questionamentos importantes a serem levantados são “Por quê foram representadas?”, “O fato de terem sido representadas as tornam mais importantes?”, “Por que são mais importantes?”, “Para quem são mais importantes?”. Nisto é importante lembrar os estudantes do contexto do advento do capitalismo e da importância dada às rotas comerciais.
® Quanto à segunda imagem, pode ser destacada a manutenção da Catedral de Basileia em uma espécie de acrópole, e de uma ponte, confirmando que certos elementos do traçado urbano foram mantidos. Questionamentos importantes são “Quais outros elementos urbanos podemos identificar?”, “Que rio é este?”, “As distâncias são precisas?” etc.
Figura 1 – Xilogravura do Burgo de Basileia
Fonte: Hartmann Schedel, Crônica de Nuremberg, 243v/244r (1493). Domínio Público. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Liber_Chronicarum_f_243v_244r.jpg. Acesso em: 9 de jul. 2022.
Figura 2 – Imagem Aérea de Basileia
Fonte: recorte de Google Earth (2021).
- Atividade 3:
® Materiais: figuras 3 e 4, destacadas abaixo, e caderno.
® Proposta: a ideia é que os estudantes destaquem elementos que julguem relevantes para a análise das imagens, como o porto de Barcelona, as suas muralhas, as vias externas à cidade, os campos etc.
® Apesar da primeira imagem ter sido produzida no século XVIII, possui grande relevância para a análise da Barcelona medieval. Pode-se destacar a íntima relação entre o porto e a cidade, bem como a grande importância do mesmo para esta, já que todas as suas vias principais levam para lá. Nisto também é importante lembrar os estudantes do contexto de advento do capitalismo e da importância dada às rotas comerciais.
® Na segunda imagem destaca-se a manutenção de grande parte do traçado urbano medieval naquilo que outrora correspondeu a Barcelona. Também pode-se destacar as mudanças externas à cidade medieval, como a substituição das suas muralhas por vias e a organização distinta em quarteirões quadriláteros.
Figura 3 – Mapa Histórico de Barcelona
Fonte: Nicolas Tindal, Paul de Rapin, História da Inglaterra, (1732). Domínio Público. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Map-Barcelona-c.1700.png. Acesso em: 9 de jul. 2022.
Figura 4 – Imagem Aérea de Barcelona
Fonte: recorte de Google Earth (2021).
- Atividade 4:
® Materiais: figuras 5 e 6, destacadas abaixo, e caderno.
® Proposta: a ideia é que os estudantes destaquem elementos que julguem relevantes para a análise das imagens. Pode-se citar, sumariamente, os campanários das igrejas e as torres do Castelo de Nuremberg.
® O ideal é que descrevam tudo o que veem e que sejam capazes de estabelecer conexões entre aquilo que foi mantido e aquilo que não foi. Pode-se ressaltar a quase ausência de árvores na representação em oposição à fotografia e sobre as distâncias imprecisas, as texturas dos edifícios, além de instigar questionamentos como: “Os edifícios representados desempenham as mesmas funções de outrora?” etc.
Figura 5 – Xilogravura do Burgo de Nuremberg
Fonte: Hartmann Schedel, Crônica de Nuremberg, 99v/100r (1493). Domínio Público. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Nuremberg_chronicles_-_Nuremberga.png. Acesso em: 9 de jul. 2022.
Figura 6 – Fotografia do Castelo de Nuremberg
Fonte: ArtMechanic, Wikimedia Commons (2007). Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:N%C3%BCrnberg_Burg_ArM.jpg. Acesso em: 9 de jul. 2022.
- Atividade 5:
® Materiais: figuras 7 e 8, destacadas abaixo, e caderno.
® Proposta: a ideia é que os estudantes destaquem elementos que julguem relevantes para a análise das imagens. Pode-se destacar a paleta de cores utilizada, as diferentes perspectivas representadas, a representação simultânea do interior e do exterior do edifício, o tamanho das pessoas em relação ao edifício, o rio etc.
Figura 7 – Recorte da Iluminura da Torre de Londres
Fonte: Poemas de Carlos, Duque de Orleães, The British Library, MS Royal F ii, f. 73. Domínio Público. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:The_Tower_of_London_-_Poems_of_Charles,_Duke_of_Orleans_(c.1500),_f.73_-_BL_Royal_MS_16_F_II.jpg. Acesso em: 9 de jul. 2022.
Figura 8 – Fotografia da Torre de Londres
Fonte: Bob Collowân, CC-BY-SA-4.0, Wikimedia Commons (2013). Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Tower_of_London_viewed_from_the_River_Thames.jpg. Acesso em: 9 de jul. 2022.
- Atividade 6 (Conclusiva):
® Materiais: caderno.
® Proposta: a ideia é que os estudantes elaborarem uma espécie de conclusão sobre aquilo que puderam compreender das atividades anteriores, articulando as mesmas. O ministrante pode fornecer auxílio nesta etapa através de questionamentos instigantes como: “As coisas representadas nas cidades medievais são as mesmas representadas por você na Atividade 1?”, “A precisão era uma necessidade para os artistas medievais?” etc. Pode-se inclusive comentar que a ideia destes artistas era representar não necessariamente o que estava na paisagem que observavam (isto é, ao alcance do seu campo de visão), mas no ambiente da própria vivência.
® Ao final, o ministrante pode apresentar o seguinte trecho aos alunos: “O artista medieval acreditava poder traduzir convincentemente o que tinha diante dos olhos ao representar as sensações que tinha ao caminhar, experimentando estruturas, quase de maneira tátil, a partir de muitas perspectivas distintas, e não de um ponto de vista geral único” (HARVEY, 1992, p. 220).
® É importante que seja frisada a relação das imagens apresentadas com a citação de Harvey, destacando elementos analisados anteriormente, como as cores utilizadas, a multiplicidade de perspectivas etc.
ATIVIDADE DE AVALIAÇÃO:
- Materiais: barbante, canetas coloridas, cartolina, cola normal ou cola quente, garrafas pet, isopor, lápis de cor, palitos de dente, palitos de sorvete, rolos de papel higiênico, tesoura, tintas.
- Proposta: a ideia é que os estudantes reúnam-se em grupos (estipulados de acordo com o tamanho da turma) e construam uma maquete a partir de uma das imagens trabalhadas nas atividades de 2 a 5. Nisto, os estudantes estarão desenvolvendo suas próprias noções de tridimensionalidade, ou seja, os volumes são o que há de mais importante a ser representado, não requerendo muitos detalhes. É importante que os estudantes percebam que estão criando uma distorção a partir de outra distorção, e que não são fornecidas informações suficientes para que construam o traçado urbano tridimensional. Assim, devem organizar a cidade através da sua representação mesmo sem conhecê-la. É preciso que, ao final, o ministrante destaque aos estudantes que os modelos criados são muito variados entre si e que não correspondem à realidade, pois nenhuma representação corresponde exatamente à realidade, mas ao que se deseja representar. Pode-se inclusive organizar uma exposição coletiva com todas as maquetes criadas, ao lado das imagens originais.
REFERÊNCIAS E SUGESTÕES DE LEITURA:
BENEVOLO, Leonardo. História da Cidade. São Paulo: Perspectiva, 2011.
DRAKE, Frederick D.; BROWN, Sarah Drake. A Systematic Approach to Improve Students' Historical Thinking. The History Teacher, v. 36, n. 4 (ago. 2003), pp. 465-489.
HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1992.
HEERS, Jacques. La Ville au Moyen Age. Paris: Fayard, 2010.
LE GOFF, Jacques. O Apogeu da Cidade Medieval. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
LE GOFF, Jacques. Por Amor às Cidades. São Paulo: Editora Unesp, 2002.
PIRENNE, Henri. As Cidades da Idade Média. Mem Martins: Publicações Europa-América, 1977.
ROCHA, Paulo Mendes da. Maquetes de Papel. São Paulo: Cosac Naify, 2007.
ROLNIK, Raquel. O que É Cidade? São Paulo: Brasiliense. 1994.
VELLOSO, Leonardo Meliani. Um Maravilhoso Imaginário: Cartografia e Literatura na Baixa Idade Média e no Renascimento. Jundiaí: Paco Editorial, 2017.
Anexo | Tamanho |
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