SANTO AMARO, SUAS INDÚSTRIAS E A ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas 

Departamento de História

 

HISTÓRIA DA CIDADE DE SÃO PAULO:

SANTO AMARO, SUAS INDÚSTRIAS E A ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA

 

 

VITOR ANTUNES MARTINELLI BORBA 

 

O presente trabalho tem como objetivo propor uma sequência didática, em três aulas, para alunos do ensino médio, especialmente os da zona sul da capital paulista, utilizando como referência o bairro de Santo Amaro.

A  proposta didática está  ancorada em  uma  transdiciplinaridade entre as áreas de História e Geografia, matérias escolares que se complementam e estão, por muitas vezes, entrelaçadas.

Esse planejamento foi feito considerando aulas de 45 minutos e para a sistematização das aulas, as dividirei tematicamente da seguinte forma, :

1)  A História de Santo Amaro (1552 - 1935)

 

   Apresentar, a partir do texto de apoio, a História do bairro que fora município, desde a época colonial até a sua anexação à capital paulista, em 1935.

2)  Industrialização e Desindustrialização (1935 - 2000)

 

   Apresentar como se deu a industrialização da região a partir do texto base.

   Comparar com  o  processo de  industrialização de outras áreas da cidade.

   Guerra Fiscal (década de 1990) e a evasão das indústrias para fora da cidade de São Paulo.

   Analisar mudanças e permanências à partir das fotos apresentadas.

 

3)  Especulação imobiliária e gentrificação

 

   Explicar os  conceitos de  especulação imobiliária e gentrificação, a partir do texto.

   Análise de propaganda imobiliária da região.

 

   Analisar e discutir o mapa e a foto de satélite “Mercado Imobiliário - Santo Amaro (2010 - 2019)”.

 

A História de Santo Amaro (1552 - 1935)

 

 

 

A história da cidade de São Paulo está muito ligada a história de Santo Amaro, afinal, até 1935, Santo Amaro era um município independente que abrangia a área da atual zona sul de São Paulo.

Como afirma MARCÍLIO1: “O povoamento do território do planalto paulistano (...) foi feito a partir de numerosas pequenas aglomerações, através de um desenvolvimento polinuclear e descontínuo” e uma dessas numerosas pequenas aglomerações viria a ser posteriormente o município de Santo Amaro.

Em 1552, foi formado com a ajuda do cacique Caiubí, irmão de Tibiriçá, o aldeamento, de índios Guaianazes, de Geribatiba, ao sul do aldeamento de Piratininga, onde em 25 de janeiro de 1554 viria a ser fundada a Vila de São Paulo de Piratininga. Em pouco tempo este aldeamento passou a se chamar Nossa Senhora da Assunção do Ibirapuera, mas por pouco tempo, pois em 1560 o padre José de Anchieta, vindo da Vila São Paulo de Piratininga, para visitar a missão jesuítica do Ibirapuera, viu que ali havia uma população considerável de indígenas cristianizados e mandou erguer ali uma capela nas terras do casal de portugueses João Paes e Suzana Rodrigues, que doaram para a nova capela uma imagem de madeira de seu santo de devoção, Santo Amaro, padroeiro dos carroceiros e agricultores. A partir daí o povoado passaria a ser chamado de Santo Amaro do Ibirapuera.

Apesar do aldeamento se mostrar promissor, em 1563 uma grande epidemia de varíola assolou o planalto paulista, dizimando as populações indígenas de diversos aldeamentos, entre eles, o de Santo Amaro, causando um esvaziamento populacional que viria a ser revertido na segunda metade do século XVII. Em

1680, Santo Amaro é elevada à categoria de Paróquia, o que afirma MARCÍLIO2 “... significa com toda a segurança que ela agrupava uma população de alguma importância. Ainda no século XVII, mais especificamente em 1606, Santo Amaro experimentaria sua primeira manufatura, como que prevendo seu futuro industrial, o

 

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1 MARCILIO, Maria Luiza. “A Cidade de São Paulo: Povoamento e População, 1750 - 1850, com base nos registros paroquiais e nos recenseamentos antigos.”. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1974. p. 41

2 Idem. p. 47

 

 

engenho de ferro de Diogo de Quadros, à mando do Governador Geral do Brasil, D. Francisco de Souza3

Ao longo do século XVIII, Santo Amaro não vivenciaria grandes eventos, sendo uma região voltada, principalmente, para o abastecimento alimentício e de víveres para a Vila de São Paulo.

durante o longo século XIX, em 1832, Santo Amaro é elevada ao status de município, assim permanecendo até sua anexação à São Paulo, em 1935, por decreto de Getúlio Vargas. Durante esse período, a cidade manteve como principal atividade econômica o abastecimento alimentício para São Paulo. Nesse período, a ligação com São Paulo se dava por dois caminhos, a Estrada para Santo Amaro, atual Avenida Santo Amaro e a estrada que margeava o rio Pinheiros, onde futuramente seria construída a Marginal Pinheiros. Um novo caminho ligando Santo Amaro ao centro de São Paulo seria aberto em 1886, pela Companhia Carris de Ferro de São Paulo a Santo Amaro, contando, inclusive, com a presença do Imperador Pedro II em sua inauguração, o trajeto feito por essa linha de trens a vapor, seria posteriormente, em 1913, convertida para bondes, esse que operaram até 1968, fazendo o trajeto da atual linha 1 Azul do Metrô de São Paulo.

 

 

Industrialização e Desindustrialização (1935 - 2000)

 

 

 

De acordo com PÁDUA4:

 

“E estruturação da metrópole de São Paulo, como bem nos mostra LANGENBUCH, tem uma relação indissociável com a expansão da indústria na cidade. O uso do solo industrial assume uma grande importância com a consolidação

da industrialização. A cidade, da rede ferroviária estabelecida pela economia do

 

café para a exportação do produto pelo Porto de Santos, capitalizou os ganhos desta economia. É justamente ao longo das ferrovias que no final do século XIX se constituem os primeiros bairros industriais e operários, como a Lapa, a Água Branca, 

a Barra Funda, o Bom Retiro, o Brás, a Moóca, o Belenzinho, o Ipiranga, no trecho das ferrovias Santos-Jundiaí e Sorocabana.”

 

 

 

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3 GOLDSTEIN, Hélio; LANDGRAF, Fernando José G.; TSCHIPTSCHIN, André P. “Notas Sobre a História da Metalurgia no Brasil (1500 - 1850)”. In: VARGAS, Milton (org.). “História Técnica e da Tecnologia no Brasil” São Paulo: Editora UNESP, 1994. s/ p.

4 PÁDUA, Rafael F. “Pensando os processos de industrialização, urbanização e desindustrialização em São Paulo: o caso Santo Amaro”. In: Anais do X Encontro de Geógrafos da América Latina - 20 a

26 de março de 2005 - Universidade de São Paulo. p. 11140

 

 

 

Assim, diferente das regiões industriais mais antigas da cidade, Santo Amaro

 

receberia uma ferrovia no início dos anos 1950, com a construção do ramal de Jurubatuba, da Estrada de Ferro Sorocabana, que buscava diminuir a distância entre a capital e Santos.

A industrialização do bairro de Santo Amaro começou na década de 1940, onde   “O desenvolvimento industrial nos subúrbios, segundo PENTEADO, foi propiciado principalmente por falta de espaço para a instalação de indústrias no perímetro da cidade e pela busca por lugares com condições mais adequadas à instalação industrial para certos tipos de indústrias, como facilidade de transporte, abundância de água, escoamento de detritos, etc.’”5, sendo estes últimos requisitos atendidos pelo Rio Pinheiros.

A infraestrutura de transportes chegaria nos anos seguintes, impulsionando ainda mais a industrialização da região, por dois modais diferentes, o ferroviário com ramal de Jurubatuba, construído entre 1952 e 1957 e o modal rodoviário, fortemente incentivado pela política industrializante do governo Juscelino Kubitschek com a construção da Marginal Pinheiros na década de 1970.

Nesse período, Santo Amaro se tornaria o segundo maior parque industrial da cidade de São Paulo, tendo indústrias de vários segmentos, notadamente, as indústrias têxteis e as químico-farmacêutica.

A industrialização e a desindustrialização de Santo Amaro deve ser entendida à partir do modo de produção. O parque industrial santamarense, assim como o brasileiro, foi todo construído para o sistema fordista de produção, baseado em grandes complexos industriais, onde grande parte das peças e partes utilizadas para a montagem do produto final eram produzidas in loco e montadas em linhas de montagem com clara divisão de tarefas entre os trabalhadores.

Com os anos de 1990 dois fatores importantes colaboraram para a desindustrialização de  Santo  Amaro,  e  também a  da  cidade de São Paulo. O primeiro fator foi a mudança do modelo produtivo, do fordismo para o toyotismo, onde “...terceirização da fabricação dos componentes da produção, em que as

 

grandes empresas formam uma rede de fornecedores que entregam a quantidade estritamente necessária para a produção e no momento preciso”6, eliminando assim, a necessidade de grandes unidades industriais. Outro fator surgido na década de

1990 foi a Guerra Fiscal entre estados e municípios, oferecendo isenções fiscais, grandes, e muitas vezes total, fazendo que as fábricas mudassem para cidades do interior e outros estados, causando uma descentralização industrial da cidade de São Paulo.

Nesse sentido, com o novo modelo produtivo, a cidade de São Paulo deixa de ser um centro industrial e passa a ser um centro gestor das empresas, abrigando a sede das indústrias, principalmente no eixo Paulista-Faria Lima.

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5 Idem. p. 1142

 

 

 

Análise de fotos

 

 

 

A  partir  da  discussão anterior podemos analisar as duas fotos a seguir, tiradas  na  margem  do  rio  Pinheiros,  no  mesmo  local,  em  tempos  diferentes. (Analisar permanências e mudanças na paisagem urbana)

 foto santo amaro

 

Várzea do rio Pinheiros, 1966. Fotógrafo: Milton Borba. Acervo pessoal do autor.

 

 

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6 Ibidem. p. 11145

 

 

santo amaro1

 

Ciclovia do rio Pinheiros, 2019. Fotógrafo: Vitor A. M. Borba. Acervo pessoal do autor.

 

 

 

Especulação imobiliária e gentrificação

 

 

 

Nessa parte da proposta didática, dois conceitos são importantes para a discussão, especulação imobiliária e gentrificação.

A especulação imobiliária acontece quando, nas palavras KOWARICK7, “com a chegada de melhorias urbanas em áreas antes desprovidas, eleva-se seu preço econômico à medida que decai seu ônus social”, ou seja, conforme o bairro vai ganhando melhorias como água, luz, esgoto, transporte público, etc., ou até mesmo quando essas melhorias são anunciadas, grandes incorporadoras e outros agentes capitalistas compram terrenos e esperam o preço do metro quadrado da região subir e assim terem mais lucro. Com isso, classes com maior poder econômico se mudam para o lugar, aumento o custo de vida médio da região e, por consequência, faz com

 

 

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7 KOWARICK, Lúcio. “Escritos Urbanos”. São Paulo: editora 34, 2000. p. 30.

 

 

 

que as classes mais pobres que antes moravam ali, tenham que se mudar para uma região mais periférica8, com o custo de vida dentro da sua faixa de renda.

A gentrificação está dentro de uma lógica parecida, mas o aumento do custo de vida, assim como do preço do metro quadrado, está ligado à um valor cultural da região, além das melhorias urbanas citadas. Essa atmosfera cultural é construída com a presença de casas de shows, bares, baladas, teatros, etc., aumentando o preço da região para além dos serviços públicos, agregando um valor subjetivo ao mercado imobiliário. Um exemplo de lugar, em São Paulo, que aconteceu isso é o bairro da Vila Madalena, que tradicionalmente era um bairro de classe média, mas a partir da atribuição de ser um bairro boêmio cheio de bares e restaurantes, a população que ali residia passou a ser de classe alta.

Em Santo Amaro, objeto deste trabalho, a saída das indústrias ofereceu um terreno propício para esses fenômenos, pois são as “(...) antigas regiões industriais, que se tornam visadas para esses novos investimentos por apresentarem grandes terrenos disponíveis (...)”9. Aliando a conclusão da linha 5 Lilás do Metrô de São Paulo, que interliga a região sudoeste da capital ao centro, fazendo quase o mesmo trajeto do bonde, extinto em 1968, com a atmosfera cultural criada pela presença de casas de show como o Credcard Hall e HSBC-Brasil, espaços de conferências como o Transamérica Expo Center, faculdades como a UniÍtalo e a Uninove, teatros como o Teatro Paulo Autran e o Teatro Alfa, mais uma infinidade de bares e restaurantes, o  bairro que tradicionalmente era ocupado por uma classe média baixa,   está   passando   por   profundas   transformações   na   sua   composição econômica-populacional.

Um dos sintomas dessa mudança do perfil dos habitantes do bairro, além da quantidade de novos empreendimentos, são os tipos de novos empreendimentos. Os novos condomínios de Santo Amaro seguem à risca o modelo de autossegregação adotado pela elite paulistana desde os anos 1990, denominado

                                                                                                                                                                 

 

 

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8 Sendo as periferias “(...) condição social da pobreza, o que possibilita admitir sua presença tanto na periferia quanto no centro, propriamente ditos” - BURGOS, Rosalina. “Periferias Urbanas: O chão dos catadores no urbano periférico”. São Paulo: Humanitas, 2013. p. 24.

9 PÁDUA, Rafael F. “Produção estratégica do espaço e outros produtos imobiliários”. In: “A cidade como negócio”. (orgs) CARLOS, Ana Fani; VOLOCHKO, Danilo; ALVAREZ, Isabel P. p. 145.

 


por  CALDEIRA, como  "enclaves fortificados"10

que  articulam "(...) cinco  elementos básicos:  segurança, isolamento, homogeneidade social, equipamentos e serviços" 11, 

Como podemos ver na propaganda imobiliária a seguir:

 

(Analisar o anúncio  com os alunos)

 

 

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1° CALDEIRA, Teresa P. "Cidade de Muros:Crime, segregação  e cidadania em São Paulo" São

Paulo: Editora 34; EDUSP, 2000. p. 258

11 Idem. p. 265


 

Para termos uma noção da dimensão do avanço desses fenômenos no bairro de Santo Amaro, foram elaborados mapas mostrando o avanço desses novos empreendimentos nos últimos dez anos. Para essa análise, foi selecionada a área entre a Avenida das Nações Unidas, Rua Verbo Divino, Avenida Santo Amaro e Avenida João Dias, área que corresponde a aproximadamente do bairro.

(Analisar e discutir o mapa e a foto de satélite com os alunos)

imagem santo amaro

 santo amaro4

 

 

Foto de satélite obtida através do Google Maps,legenda pelo autor.

imagem santo amaro 5

 

 

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12 FATORELLI, Carlos. “As Indústrias e a Desindustrialização em Santo Amaro - Brasil: Estado Forte de Povo Fraco - Tecnicismo Forçado”. Disponível em:

<http://carlosfatorelli27013.blogspot.com/2010/11/as-industrias-e-desendustrializacao-em.html>. Acesso em 12/11/2019.

13 FATORELLI, Carlos. “A Metal Leve e Outras Indústrias de Santo Amaro”. Disponível em:

<http://www.saopaulominhacidade.com.br/historia/ver/4568/A%2BMetal%2BLeve%2Be%2Boutras%2

Bindustrias%2Bem%2BSanto%2BAmaro>. Acesso em 12/11/2019.

 

Bibliografia:

 

BERARDI, Maria Helena Petrillo. “Santo Amaro: História dos Bairros de São

 

Paulo”. São Paulo: Prefeitura Municipal - Secretaria de Educação e Cultura,

 

1981.

 

BURGOS, Rosalina. “Periferias Urbanas: O chão dos catadores no urbano periférico”. São Paulo: Humanitas, 2013.

   CALDEIRA, Teresa P. “Cidade de Muros: Crime, segregação e cidadania em

 

São Paulo” São Paulo: Editora 34; EDUSP, 2000.

 

   FATORELLI, Carlos. “A Metal Leve e Outras Indústrias de Santo Amaro”.

 

Disponível em:

 

<http://www.saopaulominhacidade.com.br/historia/ver/4568/A%2BMetal%2BL eve%2Be%2Boutras%2Bindustrias%2Bem%2BSanto%2BAmaro>. Acesso em 12/11/2019.

   FATORELLI, Carlos. “As Indústrias e a Desindustrialização em Santo Amaro - Brasil: Estado Forte de Povo Fraco - Tecnicismo Forçado”. Disponível em:

<http://carlosfatorelli27013.blogspot.com/2010/11/as-industrias-e-desendustri alizacao-em.html>. Acesso em 12/11/2019.

   GOLDSTEIN, Hélio; LANDGRAF, Fernando José G.; TSCHIPTSCHIN, André P.  “Notas  Sobre  a  História  da  Metalurgia  no  Brasil  (1500  -  1850)”.  In: VARGAS, Milton  (org.).  “História Técnica e da Tecnologia no Brasil” São Paulo: Editora UNESP, 1994.

   KOWARICK, Lúcio. “Escritos Urbanos”. São Paulo: editora 34, 2000

 

   MARCILIO, Maria Luiza. “A Cidade de São Paulo: Povoamento e População,

 

1750  -  1850,  com  base  nos  registros paroquiais e  nos recenseamentos antigos.”. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1974

   PÁDUA, Rafael F. “Pensando os processos de industrialização, urbanização e desindustrialização em São Paulo: o caso Santo Amaro”. In: Anais do X Encontro de Geógrafos da América Latina - 20 a 26 de março de 2005 - Universidade de São Paulo

 

     PÁDUA, Rafael F. "Produção estratégica do espaço e outros produtos imobiliários". In: "A cidade como negócio". (orgs) CARLOS, Ana Fani; VOLOCHKO, Danilo; ALVAREZ, Isabel P.

 

 

 

 

 

Referencia
Graduandos