Uma história para os moradores do bairro de Taipas: autoconstrução, associação e sobre o futuro

Universidade de São Paulo
Departamento de História – FFLCH
Uma história para a cidade de São Paulo – Um desafio pedagógico – 2016
Profª. Dra. Antônia Terra Calazans Fernandes
Uma história para os moradores do bairro de Taipas: Autoconstrução, associação e sobre o futuro.
Por Tathiana Madja de Sousa – 7198891
 
 
Introdução
 
Localizado na região noroeste de São Paulo, o bairro de Parada de Taipas, subdistrito da região de Pirituba-Jaraguá, constitui um exemplo de ocupação periférica, um capítulo importante para se pensar a história da cidade. Relatos e fotos gentilmente cedidos pelos moradores contam que a Rua Carmino Montouri, objeto de estudo desta sequência didática, foi ocupada desde meados dos anos 80 (Foto 1) até o início do ano de 1990, quando um suposto proprietário desapropria e carrega em caminhões dezenas de famílias para locais distantes. Como forma de resistência, a Associação dos Moradores da Vila Boa Esperança foi fundada em 28 de fevereiro de 1992 com o objetivo de garantir o direito de acesso à terra. Por intervenção da associação em conjunto com a então prefeita da época Luiza Erundina, o suposto dono foi desapropriado, tendo sido comprovada a ilegitimidade da posse.
 
No quadro do fortalecimento dos movimentos sociais urbanos, o governo Erundina (1989-1992) caracterizou-se pela consolidação de canais de participação popular na administração pública, invertendo as prioridades de investimento na cidade, estimulando a autogestão em direção às políticas de habitação social1. Tal como se nota
 
1 AMARAL, Ângela de Arruda Camargo. Primeira Administração do PT em São Paulo, in Habitação na cidade de São Paulo. 2 edição revisada. São Paulo, Polis / PUC – SP, 2002, 120p. (Observatório dos Direitos do Cidadão: acompanhamento e análise das políticas da cidade de São Paulo, 4 ) http://www.polis.org.br/uploads/851/851.pdf (Último acesso em 11/12/2016).
 
na lei 11.134, de 5 de dezembro de 19912, que abre espaço para a criação das associações de bairro, o governo Erundina promoveu a institucionalização da participação popular, possibilitando experiências concretas de transformação do espaço.
 

A segunda foto registrou a festa de confraternização que aconteceu no mês de dezembro de 1992, quando os antigos moradores conseguem voltar para aquela região. Na memória dos moradores e moradoras, surge o momento em que no lugar das cercas é inaugurada uma praça, onde são plantadas as primeiras mudas de árvores. Ainda nesta foto, percebe-se que não há qualquer infraestrutura na região (água canalizada, esgoto, pavimentação e energia elétrica) e as casas estão em fase de construção.
Como é possível perceber no Estatuto da Associação dos Moradores da Vila Nova Esperança (Foto 3), não somente a luta pelo acesso à terra, mas também a agência a favor da transformação do espaço e da garantia de melhores condições de vida para os moradores também entrou no rol das reivindicações da associação, interferindo na definição de políticas urbanas para aquela região. Por volta de três anos mais tarde (Foto 4), percebe-se que o bairro em autoconstrução passou por algumas mudanças na infraestrutura, os moradores podem contar com ruas iluminadas, apesar de não asfaltadas.
 
A esse respeito, Teresa Pires do Rio Caldeira reforça que, nos anos 80 e 90, as classes trabalhadoras organizaram movimentos sociais, exigindo melhores condições e o direito à cidade. Segundo a autora, mesmo os políticos de direita perceberam que seu futuro em um sistema de eleições livres passou a depender da atenção dispensada à periferia, que melhorou em termos de infraestrutura urbana3. A foto 5 é uma demonstração de que a ação política dos moradores gerou transformações positivas no espaço, não obstante o fato de algumas casas permanecerem inacabadas.
 
Esse inacabamento é expressão da irregularidade a que foram submetidas as classes trabalhadoras. Enquanto as políticas urbanas se concentraram por muito tempo em um território central reservado para as elites, as camadas mais pobres da população
 
2 Diário Oficial do Município de São Paulo, Ano 36, Número 231. 06-12-1991 http://dobuscadireta.imprensaoficial.com.br/default.aspx?DataPublicacao… (Último acesso em 11/12/2016).
3 CALDEIRA, 2000. P. 236
 
foram empurradas pela expansão das avenidas e do sistema de ônibus para as regiões suburbanas e rurais, onde podiam comprar terrenos baratos e irregulares4. Segundo Caldeira, a classe média alta contou com financiamento para a construção de suas casas em bairros legalizados e bem equipados, enquanto que a população pobre, mergulhada numa região precária e ilegal, construiu suas casas sem ajuda das autoridades. Na sexta foto, por exemplo, mostra uma região ainda degradada na qual os moradores são obrigados a viver perto de um comércio de sucatas onde são comercializadas toneladas de ferro velho. Ao fundo, condomínios avançam, assinalando mudanças na região.
 
Autoconstrução e ilegalidade também caracterizam o modo de ocupação em Parada de Taipas. Infelizmente, apesar das conquistas alcançadas pela associação, os moradores ainda não conseguiram se tornar proprietários, o que os deixa em situação de vulnerabilidade diante de novos projetos urbanísticos que venham a surgir. A chegada dos condomínios fechados e do shopping center na região (Foto 7) foi recebida de modo positivo pelos moradores, contudo, tal como Caldeira adverte, resta saber se este fenômeno pode significar um novo padrão de desigualdade social de exclusão e de expulsão daqueles que não podem pagar pelas benfeitorias5. A imagem 8 aponta para esse aspecto da gentrificação, quando a qualificação dos espaços não acontece como uma medida de inclusão social, mas de enobrecimento e expulsão dos moradores mais vulneráveis.
 
 
Objetivos
 
A presente sequência didática possui como objetivos propalar entre alunos os seguintes aspectos da História da cidade de São Paulo:
I – Discutir a história dos modos de ocupação por parte das camadas mais pobres da população nas periferias, abordando o processo expansão em direção às áreas mais afastadas pela implantação do sistema de ônibus e das avenidas e os loteamentos periféricos irregulares como estratégia de sobrevivência.
 
4 P.224
5 P. 231.
 
II – Tornar consciente entre os estudantes o problema dos padrões de segregação urbana, do abandono da periferia no que se refere às políticas urbanas de oferta de infraestrutura, lazer, transporte, cultura, etc.
 
III – Divulgar e historicizar as ações das classes trabalhadoras, suas intervenções na construção de um espaço digno, as mobilizações pelo direito à cidade por parte daqueles que por muito tempo foram negligenciados.
 
IV – Inserir em sala de aula o debate a respeito da migração dos apartamentos de alto padrão das regiões centrais para as regiões periféricas e como a população de baixa renda vivencia esse processo.
 
 
Métodos e Estratégias
 
1°Parte: Esta parte será dedicada exclusivamente à investigação prévia dos documentos pelos alunos . Divida a sala em grupos, faça quites com os documentos e entregue-os para cada equipe. Como proposta de atividade coletiva, peça para cada grupo escrever uma narrativa, propondo formas de associações entre as imagens.
 
Foto 1: Rua Carmino Montouri vista de cima. Primeiras construções em 1989
 
Foto 2: Festa de comemoração à reintegração de posse. Dezembro de 1992.
 
Foto 3: Estatuto da Associação dos moradores da Vila Boa Esperança.
 
Foto 4: Rua Carmino Montouri por volta de 1995
 
Foto 5: Rua Carmino Montouri em 2016
 
Foto 6: Vista da Rua Carmino Montouri - 2016
 
Foto 7: O bairro de Parada de Taipas em 2016: Shopping Cantareira à esquerda e novos condomínios à direita. Supermercado Sonda ao centro.
 
Foto 8: Ilustração representando o fenômeno da gentrificação.
 
 
2° Parte: Esta etapa possui como finalidade resolver o “quebra-cabeça” das imagens junto com os estudantes. Em um primeiro momento, peça para os grupos apresentarem os resultados do trabalho em equipe. Em seguida, dependendo do que for apresentado, discuta com os alunos cada uma das imagens, lançando perguntas para os alunos no sentido de tornar evidente a história dos moradores de Taipas.
 
 
Sugestão de roteiro:
a) Peça para os alunos descreverem o espaço e as ações da foto 1. Identifique o começo de um bairro em auto-construção.
 
b) O que está sendo registrado na foto 2? É um evento público ou familiar? Como podemos descrever o espaço nesta foto?
 
c) Que tipo de documento está registrado no texto da foto 3? Podemos estabelecer relações com algumas das fotos? Se sim, quais fotos? Encontre relações com a foto 2, relacionando a festa de reintegração com a fundação da associação.
 
d) Descreva e compare o espaço nas fotos 4 e 5? Que mudanças e permanências podemos identificar? Associe as mudanças às reivindicações presentes na foto 3.
 
e) Quais são os problemas retratados na foto 6? Caracterize os problemas enfrentados em bairros periféricos.
 
f) Que mudanças podemos identificar na foto 7? É possível encontrar contrastes nessa imagem? Mencionar o atual processo de verticalização do bairro.
 
g) Qual o problema retratado na ilustração 8? É possível comparar com o que está sendo retratado na foto 7? Defina rapidamente o conceito de gentrificação.
 
3° Parte: Trata-se de um momento no qual o professor expõe um panorama geral das várias temáticas, no sentido de relacionar a história dos moradores de Parada de Taipas com a história da expansão em direção às periferias, as formas de ocupação do espaço, as estratégias de lutas e o atual processo de deslocamento dos condomínios fechados para estas regiões.
 
 
Sugestão de roteiro:
 
a) Aborde as mudanças históricas ocorridas no padrão de segregação urbana: I – Cidade concentrada em diferentes grupos sociais, II – Cidade dividida entre centro e periferia e III – Enclaves fortificados;
 
b) Mostre detalhes das formas de ocupação na periferia, a respeito dos loteamentos periféricos, priorizando o aspecto da falta de políticas públicas na periferia concomitante a uma presença efetiva de planejamento urbano nas áreas nobres;
 
c) Desenvolva sobre o surgimento de mobilizações na periferia, as lutas pelo direito à cidade, a importância das associações de bairro no governo Erundina e as intervenções a favor das políticas habitacionais;
 
d) Contextualize a mudança dos empreendimentos de luxo para as regiões periféricas, definindo o conceito de gentrificação. Discuta com os alunos o caráter excludente das políticas públicas de melhoria.
 
 
Bibliografia
 
AMARAL, Ângela de Arruda Camargo. Primeira Administração do PT em São Paulo, in Habitação na cidade de São Paulo. 2° edição revisada. São Paulo, Polis / PUC – SP, 2002, 120p. (Observatório dos Direitos do Cidadão: acompanhamento e análise das políticas da cidade de São Paulo, 4) http://www.polis.org.br/uploads/851/851.pdf (Último acesso em 11/12/2016).
 
CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. Cidade de muros – Crime, segregação e cidadania em São Paulo. SP: Editora 34; EDUSP, 2000, p.211-255.
Diário Oficial do Município de São Paulo, Ano 36, Número 231. 06-12-1991 http://dobuscadireta.imprensaoficial.com.br/default.aspx?
 
DataPublicacao=19911206&Caderno=DOM&NumeroPagina=1 (Último acesso em 11/12/2016).
 
KOWARICK, Lúcio e SINGER, André. A experiência do partido dos trabalhadores na prefeitura de São Paulo. Revista Novos Estudos, v. 1, nº 195, março de 1993.
 
MARTINS, Maria Lucia Refinetti. Descentralização e Subprefeituras em São Paulo: experiência da gestão 1989-1992: prefeita Luiza Erundina de Sousa. Projeto Labhab – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – USP. Novembro de 1997. http://www.fau.usp.br/depprojeto/labhab/biblioteca/textos/martins_desce… (Último Acesso 11/12/2016).
Referencia
Graduandos