A ditadura em agonia: As greves operárias do ABC de 1979

Universidade de São Paulo – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Aluno: Reinaldo Santos de Souza n. USP: 5682800
Disciplina: Ensino de História: Teoria e Prática – noturno
Prof. Antônia Terra

 

Sequência Didática

 

A ditadura em agonia: As greves operárias do ABC de 1979

 

Introdução


Dentre os acontecimentos mais relevantes para a História recente do Brasil, indubitavelmente as greves do ABC ocorridas no final da década de 1970 e início da década de 1980 figuram em uma posição de destaque. O golpe de 1964, que instaurou uma ditadura civil-militar no Brasil, atacou duramente as organizações dos trabalhadores, tanto os sindicatos quanto os movimentos populares. Do início da ditadura até as greves do ABC, houve, via de regra, uma grande paralisia do movimento operário, salvo por algumas exceções pontuais (greve de Osasco em 1968, e também em Minas Gerais no mesmo período). O Ato Institucional 5, instaurado em dezembro de 1968, endureceu ainda mais o regime, dificultando a possibilidade de mobilização dos trabalhadores. Nesses marcos, as greves do ABC rompem com uma paralisia de cerca de 15 anos do movimento operário brasileiro, aumentando a crise da ditadura em seu momento final e de maior agonia, e iniciando um novo ciclo de reorganização do movimento sindical brasileiro. Tal reorganização foi assentada no crescimento da planta industrial impulsionado pelo regime ditatorial, forjando novas lideranças e novas organizações, como é o caso da Central Única dos Trabalhadores, e encontrando sua expressão no plano político através do PT.
 

Em nossa avaliação, a queda da ditadura está intrinsecamente relacionada com as mobilizações de massas ocorridas no país durante a primeira metade da década de 1980, que tiveram nas greves do ABC seu pontapé inicial, bem como sua maior referência. Apesar da transição democrática ter se dado através de um acordo entre as frações burguesas que disputavam o poder no momento, a mobilização dos trabalhadores foi determinante para decretar o fim da ditadura, ainda que não tenha sido suficiente para impor uma derrota mais categórica ao regime. Para além disso, as lideranças sindicais surgidas durante tais greves se consolidaram como grandes referências políticas durante o regime democrático, especialmente Lula, que de representante dos trabalhadores em luta passou a ser o representante da conciliação de classes, atingindo, com isso, a presidência da república. Esses elementos são mais que suficientes para comprovar a importância histórica das greves do ABC e sugerir seu estudo em sala de aula como um dos capítulos da crise final da ditadura civil-militar brasileira.

 

Objetivos
 

O estudo desse tema visa desenvolver nos alunos uma visão de conjunto acerca do período histórico estudado, bem como das suas implicações atuais. Para além disso, os materiais pedagógicos mobilizados para a compreensão do tema, permitem aos alunos o desenvolvimento de instrumentos de análise de fontes, especialmente fílmicas, bem como o senso crítico no confronto de visões distintas, através da análise de publicações da imprensa escrita. Do ponto de vista teórico, pretende-se ainda abordar o tema na perspectiva da “história vista de baixo”, isto é, considerando os trabalhadores em greve como sujeitos da História.

 

Plano de aulas e materiais utilizados


Em princípio, prevemos três encontros para a abordagem do tema, que pode ser inserido, conforme dito acima, nas aulas sobre a ditadura militar e a transição democrática.
 

Aula 1
 

No primeiro encontro, o objetivo é discutir a greve de 1979 em si, localizando alguns dos elementos que levaram à sua eclosão. Tendo a greve como ponto de partida, pode-se discutir ainda algumas características mais gerais do período ditatorial, especialmente a repressão sobre as organizações de massas.


Sugere-se como material pedagógico principal para a aula excertos do filme “ABC da Greve”, de Leon Hirszman. O filme como um todo pode ser acessado no youtube no link: http://www.youtube.com/watch?v=BVKzJ_wOQyM
 

 

 

 

Neste ponto, a sugestão é que seja feita uma edição com alguns excertos do filme que melhor possam auxiliar na abordagem do assunto. Sugerimos, como ponto de partida para o debate com a turma, a seleção de alguns depoimentos de trabalhadores que versam sobre as condições de trabalho nas fábricas, bem como uma das passagens do filme na qual um diretor de uma das fábricas é conduzido em um passeio pela cidade de São Bernardo, explicitando as diferenças nas condições de moradia dos trabalhadores e dos empresários e altos funcionários das indústrias da região. Avaliamos que esses excertos do filme auxiliam no início de um debate acerca das condições de vida e de trabalho dos operários em questão e, portanto, das motivações da greve. Do ponto de vista metodológico, podem ainda ser exploradas as técnicas de construção do vídeo, bem como o questionamento aos alunos acerca das posições ideológicas do próprio cineasta. O cineasta se mostra neutro? Como ele expõe suas posições?
 

Após isso, sugerimos que sejam selecionadas outras imagens que possibilitem discutir a própria dinâmica de organização de uma greve, tendo em vista que a maioria dos alunos não vivenciam processos de mobilização de trabalhadores em seu cotidiano. E por fim, a seleção de algumas imagens do filme acerca da repressão estatal ao movimento pode servir de ponto de partida para o debate sobre o período histórico que o país atravessava, iniciando uma parte expositiva da aula sobre as características gerais do regime ditatorial. Nesse ponto podem ainda ser utilizados materiais auxiliares, como imagens, músicas ou outros filmes que abordem o período.

 

Aula 2 –  Greve na imprensa
 

O objetivo geral desse encontro é o desenvolvimento nos alunos de um senso crítico na análise de informações oriundas da imprensa. O fundamental, aqui, será o debate metodológico sobre a análise dessas fontes, e não exatamente o conteúdo em si.
Neste ponto, sugerimos que seja feita uma pesquisa nos arquivos de alguns veículos de comunicação que demonstrem a cobertura feita sobre a greve no período. Destacamos aqui um trabalho desenvolvido por alguns alunos de graduação da PUC de São Paulo que analisa a cobertura dada às greves do ABC pelos jornais Folha de São Paulo, Estado de São Paulo e pelo Semanário “Movimento”. Esse trabalho pode ser acessado no link: http://abcdagreve.blogspot.com/. Neste trabalho os autores selecionam algumas matérias dos referidos veículos de comunicação acerca do evento, que podem ser utilizadas na aula. O próprio filme “ABC da Greve” também apresenta algumas manchetes da imprensa escrita, bem como passagens de noticiários televisivos.
 

Conforme já destacado, o fundamental aqui é refletir sobre as diferenças de abordagem dos veículos de imprensa. Desse modo, uma vez selecionados os objetos de análise, é importante sensibilizar os alunos através de questões metodológicas, como: quem escreve ou fala? Qual a perspectiva que tem sobre a greve? É positiva ou negativa? Enfatiza quais aspectos? A partir dessas caracterizações podemos, juntamente com os alunos, chegar a algumas conclusões sobre as diferenças de abordagem e suas motivações, trazendo ao debate informações complementares sobre o histórico dos veículos, seu alinhamento político e etc.

 

Aula 3 – Os trabalhadores em greve como sujeitos

 

O objetivo central do terceiro encontro é debater os trabalhadores em greve como sujeitos históricos, buscando questionar uma perspectiva conservadora que coloca a ênfase do processo nas lideranças surgidas no período. Além disso, busca-se relacionar o evento estudado com a situação atual, tendo em vista a chegada de Lula à presidência da república em 2002.
 

Para este encontro, sugerimos a exibição de alguns excertos do filme “Peões”, de Eduardo Coutinho. Esse filme entrevista alguns trabalhadores anônimos que participaram das greves do ABC e que aparecem nos filmes “ABC da Greve” e “Linha de Montagem”. Essas entrevistas em 2002, na véspera da eleição de Lula à presidência da república, o que permite também captar as expectativas desses trabalhadores em relação ao governo petista. A escolha do filme se justifica, sobretudo, por um critério teórico-metodológico, qual seja, a ênfase nos personagens anônimos, em detrimento das lideranças do movimento.
 

Uma vez selecionados os excertos, que fica a critério do educador, sugerimos que seja feita uma rápida comparação com o filme “ABC da greve”, localizando as diferenças relacionadas ao período em que ambos são gravados, bem como das ênfases dos cineastas, já que o filme de Hirszman enfatiza bastante as lideranças do movimento, enquanto o de Coutinho enfatiza os personagens anônimos.
 

Sugerimos, ainda, a exibição de uma entrevista de Lula, já como presidente, ao cinesta Renato Tapajós, falando sobre a reedição do filme “Linha de Montagem”. Essa entrevista pode ser encontrada no link: http://www.abcdeluta.org.br/video_linhademontagem_lula.html.
 

Após a exibição da entrevista, sugere-se discutir com os alunos as diferenças entre o Lula presidente e o Lula sindicalista, bem como os impasses de um movimento que gerou uma liderança que hoje, ao ocupar o principal posto de comando do país, adota medidas contraditórias em relação ao que defendia anteriormente.

 

Bibliografia

 

Antunes, Ricardo. A rebeldia do trabalho. Campinas: Ensaio e Editora da Unicamp, 1988.
Aquino, Marina Moreira D’; Machado, Paula de Paula; Rocha, Marcela; Zinet, Caio Rubens. O ABC da Greve. Trabalho de graduação da disciplina de História Contemporânea do Brasil, Departamento de Jornalismo, PUC - SP, 2008.

 

Filmografia:

 

Hirszman, Leon: ABC da greve. Brasil, 75 min. 1990
Coutinho, Eduardo. Peões, Brasil, 85 min., 2004. 

 

Referencia
Graduandos
Anexo Tamanho
a_ditadura_em_agonia.pdf 304.09 KB